terça-feira, 7 de junho de 2011

A Swift é da Cultura - 1

O renascer da Swift
 
Ruy Sampaio e Lelé Arantes

Para os novos rio-pretenses, é preciso esclarecer que a Swift é um conjunto de prédios de uma antiga fábrica de óleo do caroço do algodão, inaugurada em 1944. Durante muitos anos, centenas de famílias de trabalhadores de Rio Preto disputaram os empregos na indústria. Diferentemente do que se apregoa, a Swift não é uma empresa inglesa, apesar da marca ter sido criada por Gustav Swift, em 1877, em Chicago. Ela foi fundada em 1907, por um grupo de investidores argentinos, com sede na Cidade do Cabo, na África do Sul, e fábrica em Puerto La Plata. Passou por uma série de transformações nos últimos anos e, atualmente, tem 100% de capital argentino, sob a presidência de Carlos Oliva Funes.
A Swift faz parte da memória afetiva de alguns milhares de rio-pretenses cujos pais e avós ganharam seu sustento nas moagens da empresa. Muitos adultos ainda guardam na memória olfativa o cheiro gostoso de paçoquinha que exalava da velha chaminé. Com a fábrica desativada no final dos anos 60, a Swift foi, por mais de uma década, um depósito de milho. Em 1981, o prefeito Adail Vetorazzo declarou a área de utilidade pública, mas foi impedido pelos vereadores de efetuar a compra.

Dois anos depois, o então prefeito Manoel Antunes concretizou as negociações e adquiriu a área - 30.116 metros quadrados de área livre, mais 7.145 metros quadrados de construção e 1.099 metros quadrados de área sem cobertura. Desde o momento da compra, a sociedade organizada defendeu a idéia de que ali deveria funcionar um centro cultural. Em setembro de 1983, representantes dos mais diversos segmentos sociais elaboraram um abaixo-assinado dirigido ao Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arquitetônico e Turístico), em São Paulo, solicitando o tombamento da Swift. Entre as lideranças estavam Daud Jorge Simão, Aloysio Nunes Ferreira Filho, Mauro Vechiato, Maria José Aziz, Antonio Brás Vernucci, Romildo Sant’Anna, Murilo Seixas, Reinaldo Volpato, Tsugugo Toma, Paulo César Naoum e Paulo Lucânia. 

Nas décadas de 80 e 90, foram organizadas algumas feiras. Mas faltou investimento para restauração e reforma dos galpões. Lina Bo Bardi veio a Rio Preto discutir a Swift, mas pouco a pouco o assunto caiu no esquecimento. O Condephaat arquivou o guichê (pedido de processo de tombamento), que só foi retirado da gaveta em 1998, por iniciativa da Amirp (Associação Amigos de Rio Preto), que reuniu novamente a sociedade para discutir a questão. Ao assumir a Prefeitura em 2001, o prefeito Edinho Araújo decidiu que a Swift seria uma das prioridades de seu governo. Ali, funcionará a Universidade Livre das Artes, oferecendo à sociedade muito mais que um segundo centro cultural.

Há 11 meses, estamos acompanhando todos os movimentos do Condephaat de São Paulo em relação ao tombamento. E mais. Temos buscado soluções para tirar a Swift da lenta degradação a que está exposta há mais de três décadas e devolver a ela vida e utilidade. A Swift, como diria Lisette Lagnado, coordenadora dos arquivos de Hélio Oiticica (Itaú Cultural), é um “território de reinvestimento cultural em espaços industriais desativados, que proporciona novas formas de urbanidades”. Todavia, não basta apenas reformar e restaurar a Swift. É preciso ocupá-la e devolver-lhe a vida. 
A Swift é um território hoje sombrio, bem ao estilo da arquitetura manchesteriana que lhe é peculiar, necessitando da vivência e da presença da população, retomando o ambiente excitante dos tempos de funcionamento de sua fábrica. Para tanto, estamos criando a Universidade Livre das Artes. Num primeiro instante, a Universidade será um espaço de produção cultural, ensaios, exposições, espetáculos, experimentalismo, com cursos de aperfeiçoamento, oficinas, workshops, seminários e aulas profissionalizantes para todos os segmentos da produção de arte.

Num segundo momento, soma-se a isso seu papel de universidade livre com cursos de extensão universitária ligados à cultura; e, num terceiro estágio, cursos superiores de arte. Teremos também uma área de convivência comum a esse tipo de ambiente. Os pessimistas poderão nos acusar de sonhadores. Os otimistas acharão acanhados os nossos sonhos. Porém, ninguém poderá nos acusar de omissos.

Temos um plano de trabalho a ser desenvolvido e, para isso, temos nos esforçado para buscar parceiros na iniciativa privada. Estamos na fase de elaboração de projetos para a conquista de recursos junto a órgãos federais e estaduais, fundações culturais e linhas de crédito a fundo perdido. Temos consciência de que o trabalho não será concretizado do dia para a noite. Justamente por isso, estamos desenvolvendo um projeto de ocupação e reforma da Swift gradativamente, tornando-a um grande canteiro de obras, acompanhando o conceito moderno de “chantier”. Não vamos ficar de braços cruzados esperando um grande projeto de reforma e restauração. Vamos, isto sim, iniciar a reforma e a ocupação paulatinamente, permeando um cronograma de médio a longo prazo que terá início com os primeiros passos de uma vitoriosa marcha. E eles já foram dados quando retiramos de dentro da Swift 34 caminhões de lixo. Agora, devemos executar a análise estrutural de todos os galpões. Dia desses, estivemos com o prefeito Edinho Araújo visitando o Sesc Pompéia, em São Paulo, em busca e know-how. Com isso, começamos a tirar a Swift da sua longa e silenciosa agonia, devolvendo-a à vida.
Diário da Região - 7/5/2002